Uma semana pós Painel da ONU confrontar publicamente o Vaticano, exigindo explicações sobre a postura da Igreja Católica perante crimes sexuais praticados por seus sacerdotes, vêm à tona arquivos que relatam detalhes dos abusos praticados entre as décadas de 60 e 80 na Arquidiocese de Chicago (EUA). Os processos, que envolviam 30 padres da cidade, foram divulgados na internet após acordo com advogados das vítimas de pedofilia.
A Santa Sé, que é signatária da Convenção da ONU sobre os Direitos das Crianças, foi forçada a admitir que os escândalos de abusos são “a vergonha da Igreja”, na tentativa de se redimir com a sociedade não apenas pelos crimes, como também pelo silêncio que mantinham para si e impunham aos outros, transferindo padres sabidamente pedófilos de cidade em cidade, sempre que eram descobertos. Essa foi apenas uma das posturas da igreja que colaboraram para a proliferação epidêmica de crimes, que oprimiam impunemente a fiéis e “pagãos”.
A notícia é um remédio amargo a toda a sociedade, que serve não só para sanar práticas presentes em uma das instituições mais antigas do mundo, como também para aqueles que, apesar de estarem fora da igreja, pertencem ao mesmo contexto em que ela se insere e, querendo ou não, acabam sofrendo influência dessa direta ou indiretamente.
Não penso que abusos sejam triste exclusividade da igreja católica. Não estamos livres da possibilidade de sermos vítimas de crimes simplesmente porque estamos nesta ou naquela profissão, casta, religião, cor, segmento social, etc. Os diversos casos noticiados mostram a disseminação do problema e a abrangência de afetados. Entretanto, o peso que a instituição teve (e tem) na História Mundial, torna sua responsabilidade ainda maior.
A formação cultural e social do Brasil, desde a época da colonização, esteve profundamente ligada à Igreja Católica. Nossa história é, sim, recente – principalmente em termos de transformações sociais e culturais.
No entanto, o problema não é só da Igreja, mas também de uma conjuntura bem maior, que gera pessoas em situação de vulnerabilidade social, à mercê de charlatães que prometem mudança em troca de “favores” ou da permissividade em relação a seus delitos e caprichos. Falo de padres, mas também de pastores, parentes de vítimas, professores, e médicos – pessoas que se valem das circunstâncias (a exemplo de sua atividade profissional ou proximidade parental) para abusar de outros menos favorecidos ou que não estão aptos a se defender. Como geralmente são as crianças as mais frágeis perante os abusos, se tornam alvos fáceis. Em outras palavras, a história é a seguinte: na tentativa de se cativar um círculo de pessoas, os pedófilos oferecem apoio moral e/ou material. Quando ganham a confiança dos pais, cometem os crimes – mas continuam sendo consideradas acima de qualquer suspeitas por se mostrarem “boas” pessoas em público.
O problema aumenta quando somado à responsabilidade que se atribui à Igreja e à religião, mas não é um problema “deles”, dos sacerdotes e beatas. Existem incontáveis casos e inúmeros fatores que colocam as crianças em risco, mas acredito o número de abusos seria menor se apenas fosse reduzida a dependência (moral e/ou material) das famílias sobre os sacerdotes. Precisamos aceitar que as igrejas, dirigidas por homens falíveis, não são perfeitas. Não é aconselhável depositar todas as fichas em apenas uma pessoa ou instituição – ainda que nos pareça, em princípio, que essa seja sinônimo de bênçãos e redenção.
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